quinta-feira, 26 de março de 2015

VYA ESTELAR

Por Fátima Alves

"Vivenciar o envelhecimento exige que se viva numa dinâmica"

O ser humano passa por diferentes etapas em seu desenvolvimento e cada uma dessas etapas apresenta características e exigências específicas, que muitas vezes há necessidade de adaptação e experimentações para levar ao funcionamento de cada parte do corpo através do movimento.
Sabemos que a velhice é inevitável e traz diversas perdas funcionais e dificuldades na adaptação, por isso a importância da utilização de atividades desde cedo para que o processo de decadência em relação ao corpo, as transformações sejam readaptadas da melhor forma para o dia a dia dessa pessoa. Precisamos saber que a velhice envolve dois processos, sendo um fisiológico, que denomina-se como senescência e o metabólico que é a senilidade.

A psicomotricidade nesta etapa de vida (velhice) é muito importante, pois permite que a partir do movimento o nível de conexão seja identificado entre o pensamento e a ação, através de atividades psicomotoras adaptadas, a fim de se retardar perdas em suas capacidades e proporcionar capacidades e habilidades para a continuidade de participação ativa na sociedade bem como uma maior autonomia.

A psicomotricidade auxilia o idoso a lidar melhor com suas limitações, favorecendo a relação consigo mesmo, com o outro e com o mundo que o cerca. Levando-o a conseguir enxergar e potencializar suas AVD's (atividades da vida diária), trabalhando um maior conhecimento corporal, suas possibilidades e habilidades e dessa forma proporcionar melhor qualidade de vida. É uma integração que leva esse idoso a desenvolver capacidades motora, mental, afetiva e social, de forma mais saudável e assim promover saúde combatendo ou prevenindo doenças e fazendo-o entender que ainda existe e faz parte de uma sociedade, muitas vezes como peça fundamental. A psicomotricidade ajuda a oferecer o equilíbrio entre o corpo e o ambiente, estabelecendo saúde, realizando movimentos de forma consciente, intencional e sensível e quebrando paradigmas de que envelhecer não é morrer.

A atuação desta ciência na velhice visa oferecer atividades de caráter preventivo, de recuperação e de conservação, de forma funcional, levando o idoso a melhora e ao aprimoramento de suas bases neurofisiológicas. É sugerido que a atividade psicomotora para o idoso seja de forma lenta, sem muito esforço com observação da capacidade cardiorrespiratória e com a intenção de aumentar gradativamente essas atividades, quando respondidas positivamente. Faz-se necessário, através dessas atividades favorecer o bem-estar biopsicossocial e estimular a conscientização sobre a velhice.
A imagem que se tem hoje da velhice é ainda muito pessimista. Associa-se sempre à pessoa que envelhece a ideia de decadência física, psíquica e social, configurando-se uma fase de perdas que se sobrepõe aos ganhos, como sabedoria, experiência e liberdade.

Esta imagem da velhice, construída socialmente, foi calcada em valores e conceitos estigmatizados, evidenciando-se os aspectos negativos dessa etapa da vida. A inatividade e a doença são alguns dos traços que caracterizam o "ser velho" no imaginário das pessoas na sociedade atual.

Como reflete Simone de Beauvoir (1990): "Eu conservo, do passado, os mecanismos que se mostraram no seu corpo, os instrumentos culturais de que me sirvo, meu saber e minhas ignorâncias, minhas relações com outrem, minhas ocupações, minhas obrigações".

O corpo, enquanto movimento, é a apresentação da existência e da forma de ser do homem; este homem que é o seu corpo, que o reinventa através de suas experiências psicomotoras e através da relação que estabelece com o seu corpo e movimento, é que ele constrói a sua forma de percepção do mundo - veja textos anteriores.

O processo de conscientização dos idosos em relação ao envelhecimento de seus corpos, através do movimento corporal, tem diferentes significados, que podem diferir de idoso para idoso, e que estão fortemente relacionados à esfera existencial, (social, afetiva). Ou seja, para os idosos, a pressão externa que a sociedade imprime na relação com seu corpo é muito forte, pois o padrão de beleza, hoje, é antagônico ao corpo que sente ter. Portanto, cobram de si mesmos uma conduta no sentido de ter um corpo de acordo com o estereótipo divulgado pela mídia.

Como trabalhar para ser saudável, se tudo caminha para um modelo de corpo e movimento enaltecedor da eterna juventude?

A sociedade clama por um corpo jovem, saudável e belo, e a atividade física e a estética estão cada vez mais voltadas a para desenvolver esse padrão de ser humano (moldado).

Segundo Maurice Merleau Ponty (1996), "Há uma relação do corpo consigo mesmo que se transforma no vínculo do EU com as coisas". Portanto, temos que romper este estigma do envelhecimento.

Através das análises dos dados coletados, reconhecemos que existem dois pontos importantes a serem explorados nos adultos em processo de envelhecimento que possibilitam o encontro com o EU autêntico que envelhece: a inibição psicológica e a inibição corporal, pois não é o tempo que proverá a dificuldade do movimento, mas sim, o desuso.

Muitos idosos subestimam seus potenciais, físico e motor, em função da velhice, incorporando uma sensação de incompetência para o movimento. Segundo Elisabeth Frohlich Mercadante, "A vivência primeira da velhice se dá no corpo. O corpo por si não revela como atributo a velhice, mas uma vez que ela, como estigma, se instala no corpo, ela passa a inquietar o idoso. Certamente a inquietação é decorrente de uma avaliação também estigmatizada e, assim sendo, uma abordagem do velho diante do seu próprio corpo. A visão de um corpo imperfeito - em declínio, enfraquecido, enrugado, etc- não avalia só o corpo, mas sugere imediatamente ampliar-se para além do corpo, sobre a personalidade, o papel social, econômico e cultural do idoso." (Mercadante 1997:29).

As pesquisas mostram que a idade só é fator de incapacidade corporal quando o imobilismo se instalou parcial ou totalmente e se o meio ambiente exerceu papel de uma camisa-de-força. Vivenciar o envelhecimento exige que se viva numa dinâmica. Infelizmente, na maioria das vezes, o que se instaura é o inverso, favorecendo as inibições da ação.

Nas considerações finais, refletimos sobre o significado do movimento corporal para o idoso e a relação que este estabelece com as transformações ocorridas no seu corpo. O significado e a relação são diferentes para cada pesquisado, mas fortemente relacionados à esfera existencial. O envelhecimento do corpo não é impedimento para que esses idosos possam fazer planos e ir em busca de suas realizações.

Precisamos de um novo meio de ser e fazer, de aprender... e de assumir a velhice, pois através da relação que o idoso estabelece com o seu corpo e seu movimento é que ele constrói a sua forma de percepção do mundo.

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